segunda-feira, 23 de março de 2020

Death | Morte

Percy Byshe Shelley | Robert de Brose

I.
Death is here and death is there,
Death is busy everywhere,
All around, within, beneath,
Above is death—and we are death.

II.
Death has set his mark and seal
On all we are and all we feel,
On all we know and all we fear,
* * * * * * * * * * *
III.
First our pleasures die—and then
Our hopes, and then our fears—and when
These are dead, the debt is due,
Dust claims dust—and we die too.

IV.
All things that we love and cherish,
Like ourselves must fade and perish;
Such is our rude mortal lot--
Love itself would, did they not.
I.
A Morte está aqui e a Morte está lá
A Morte se ocupa em todo lugar,
Em tudo em volta, sul ou norte,
No alto, a Morte - nós somos Morte.

II.
A Morte apôs sua marca e selo
Naquilo que somos e no que vemos
No que sabemos, no que tememos.
* * * * * * * * * * *
III.
Os prazeres, primeiro, mortos estão,
Logo a esperança e o medo. E então,
Estes mortos, único débito teremos:
Pó clama por pó, e assim morremos.

IV.
Tudo que amamos e bem queremos
Deve perecer como nós mesmos
Tal nos foi dado um mortal condão,
O amor mesmo iria, caso eles não.


The Funeral of Shelley por Louis Édouard Fournier (1889).

quarta-feira, 18 de março de 2020

The Haunted Place | O Vale Assombrado

Edgar Allan Poe | Robert de Brose


In the greenest of our valleys
By good angels tenanted,
Once a fair and stately palace —
Radiant palace — reared its head.
5 In the monarch Thought’s dominion,
It stood there!
Never seraph spread a pinion
Over fabric half so fair!

Banners yellow, glorious, golden,
10 On its roof did float and flow
(This — all this — was in the olden
Time long ago)
And every gentle air that dallied,
In that sweet day,
15 Along the ramparts plumed and pallid,
A wingèd odor went away.

Wanderers in that happy valley,
Through two luminous windows, saw
Spirits moving musically
20 To a lute’s well-tunèd law,
Round about a throne where, sitting,
Porphyrogene!
In state his glory well befitting,
The ruler of the realm was seen.

25 And all with pearl and ruby glowing
Was the fair palace door,
Through which came flowing, flowing, flowing
And sparkling evermore,
A troop of Echoes, whose sweet duty
30 Was but to sing,
In voices of surpassing beauty,
The wit and wisdom of their king.

But evil things, in robes of sorrow,
Assailed the monarch’s high estate;
35 (Ah, let us mourn! — for never morrow
Shall dawn upon him, desolate!)
And round about his home the glory
That blushed and bloomed
Is but a dim-remembered story
40 Of the old time entombed.

And travellers, now, within that valley,
Through the red-litten windows see
Vast forms that move fantastically
To a discordant melody;
45 While, like a ghastly rapid river,
Through the pale door
A hideous throng rush out forever,
And laugh — but smile no more.



No mais verde em nossos campos
por bons anjos habitado,
um palácio outrora santo —
radiante — fora assentado.
5 No império do Pensamento,
lá se erguia!
Serafim tão belo assento
com as asas não cobriria!

Áureas flâmulas, brilhantes,
10 no teto ruflavam em paz
(Isso tudo fora dantes,
tempos já atrás).
E cada brisa que soprava,
naqueles doces dias,
15 pela pálida balaustrada,
um odor alado espargia.

Peregrinos que ali passavam,
Por duas janelas luminosas
Viam espíritos que dançavam
20 a uma flauta harmoniosa,
em torno ao trono que ocupava
Porfirogênio!
E a glória que lhe acordava
como guia daquel reino.

25 Com perlas e os rubis mais lindos
engastado era o portão
pelo qual vinham fluindo, fluindo
em eterna procissão
um brilho de Ecos a quem cantar
30 era de lei,
com vozes de beleza sem par,
a astúcia e a graça de seu rei.

Mas coisas ruins e mui sombrias
assediaram do rei o alto estado
35 (Pranteemos! — pois nunca o dia
raiar-lhe-á, ó desolado!)
E em volta a casa, a antiga glória
de antão florida,
é só uma má lembrada estória
40 pelo tempo esmorecida.

Ora no vale os viajantes
à luz rubra podem ver
formas vastas, bruxeleantes,
que se movem sem querer;
45
Enquanto, tal rio lugente,
pelo portão corre dali
tétrica horde eternamente,
que gargalha — e não sorri.
Max Ernst, La Horde (1927)

Fonte: Poets of the English Language (Viking Press, 1950) - Poetry Foundation

Edições

vv. 7-8 [Serafim tão belo assento | às suas asas não teria - mar 2020] | v. 12 [éons já faz].
v. 43 [tremulantes - abril 2023]
v. 48 [e já não ri - abril 2023]

terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

Erlkönig | O Elfo-Rei

J. W. von Goethe | Robert de Brose

Wer reitet so spät durch Nacht und Wind?
Es ist der Vater mit seinem Kind;
Er hat den Knaben wohl in dem Arm,
Er faßt ihn sicher, er hält ihn warm.

5 "Mein Sohn, was birgst du so bang dein Gesicht?"
"Siehst, Vater, du den Erlkönig nicht?
Den Erlenkönig mit Kron' und Schweif?" –
"Mein Sohn, es ist ein Nebelstreif."

"Du liebes Kind, komm, geh mit mir!
10 Gar schöne Spiele spiel' ich mit dir;
Manch' bunte Blumen sind an dem Strand,
Meine Mutter hat manch gülden Gewand." –

"Mein Vater, mein Vater, und hörest du nicht,
Was Erlenkönig mir leise verspricht?" –
15 "Sei ruhig, bleibe ruhig, mein Kind;
In dürren Blättern säuselt der Wind." –

"Willst, feiner Knabe, du mit mir gehn?
Meine Töchter sollen dich warten schön;
Meine Töchter führen den nächtlichen Reihn,
20 Und wiegen und tanzen und singen dich ein." –

"Mein Vater, mein Vater, und siehst du nicht dort
Erlkönigs Töchter am düstern Ort?" –
"Mein Sohn, mein Sohn, ich seh' es genau:
Es scheinen die alten Weiden so grau. –"

25 "Ich liebe dich, mich reizt deine schöne Gestalt;
Und bist du nicht willig, so brauch' ich Gewalt." –
"Mein Vater, mein Vater, jetzt faßt er mich an!
Erlkönig hat mir ein Leids getan!" –

Dem Vater grauset's; er reitet geschwind,
30 Er hält in Armen das ächzende Kind,
Erreicht den Hof mit Mühe und Not;
In seinen Armen das Kind war tot.
Quem trota tão tarde na noite sem brilho?
É um pai que cavalga levando seu filho;
Nos braços carrega o jovem sadio,
e o agarra bem firme, e o escuda do frio.

5 “Filho, por que escondes teu rosto assustado?”
“Acaso não vês, pai, o Elfo-Rei do meu lado?
O Elfo-Rei, com coroa, vestido de um manto?”
“Filho, é apenas a névoa surgindo do campo”.

“Tu, lindo jovem, vem-te embora comigo!
10 E tão belos jogos jogarei contigo;
Flores de muitas cores nascem nos prados,
Minha mãe te dará muitos robes dourados.”

“Pai, meu pai, não escutas, dos Elfos o rei,
dizendo-me ao meu ouvido tudo quanto terei?”
15 “Fica calmo, te acalma, minha criança
co’as folhas secas canta o vento e dança.”

“Queres, belo menino, comigo partir?
Minhas filhas te irão para sempre servir;
Minhas filhas que puxam da noite a ciranda,
20 E cantam e te encantam à roda nefanda”.

“Meu pai, meu pai, tampouco vês, do outro lado,
Do Elfo-rei as filhas no campo assombrado?”
“Meu filho, meu filho, bem posso enxergar,
Parecem os salgueiros tão tristes dançar” –

25 “Eu te amo, me excita tua bela aparência
E se por bem não vieres, usarei violência” –
“Meu pai, Meu pai, já as mãos deita em mim!
O Elfo-Rei me feriu de um golpe ruim!” –

Arrepiou-se o pai, cavalgou como o vento
30 Segurava nos braços o filho em tormento,
A quinta alcançou, combalido, com esforço;
Mas nos braços trazia seu filho já morto.
Der Erlkoenig (1782), por H. F. Plueddemann,
 do Deutsches Balladenbuch, Leipzig, 1852.


Fonte: Die Deutsche Gedichtebibliothek.

Anotações:

Trívia: São várias as adaptações musicais desse poema de Goethe, sendo a mais famosa delas aquela de F. Schubert (D. 328, 1815). Duas interpretações que recomendo são aquelas de Dietrich Fischer-Diskau e a incrível performance de Anne Sofie von Otter, sob a regência de Claudio Abbado, na Chamber Orchestra of Europe. Outras adaptações para música foram feitas por Carl Löwe (Op. 1, nº3, 1817-18), aqui na interpretação de Thomas Quasthoff. O que poucas pessoas sabem é que Beethoven trabalhou na transposição do poema para a música em 1792, mas nunca a terminou, por motivos desconhecidos. A partitura (WoO 131), no entanto, descoberta por Nottebohn, estava adiantada o suficiente para poder ser completada mais ou menos da forma como o compositor a intentara. Aqui pode-se escutar a reconstrução feita por Reinhold Becker em 1897, e aqui aquela completada por Cees Nieuwenhizen. A canção Dalai Lama do álbum Flugrekorder Nich Öfenen da banda de metal alemã Rammstein é uma releitura do poema de Goethe.

Edições:

v. 32 [Nos seus braços jazia seu filho, já morto - abril de 2023]